O Peixinho e o Gato

De: Lenira Almeida Heck (Júlia Vehuiah)

Ilustrações: Adriana Schnorr Dessoy

Certo dia, o Sr. Peixe chamou os peixinhos Vermelho, Amarelo e Dourado, para alertá-los dos perigos que os
cercavam quando saíam para brincar longe de casa. Falou sobre os pescadores que lançavam suas redes ao mar, das
aves e de outros animais, entre eles, o gato, que se alimentavam de peixes.

– Todo peixinho tem direito a brincar, mas fiquem longe das redes e da beira do mar, pois nesses lugares é
que mora o perigo – falou o Sr. Peixe com os olhos marejados de lágrimas.

Passado algum tempo, Vermelho pediu permissão aos pais para ir à casa de um amigo para brincar. Após ajudar a
mãe, despediu-se e lá foi todo contente. No caminho, encontrou alguns amigos e a todos cumprimentou alegremente.
Minutos depois, sentiu que algo o havia prendido.

Por mais que se debatesse, não conseguia livrar-se.
Então, começou a gritar:
– Socorro! Por favor, alguém me ajude a sair daqui!
No entanto, ninguém o escutava, porque estava num lugar pouco movimentado.
Angustiado, começou a chorar.

O pescador, por sua vez, ao puxar a rede, ficou muito contente ao ver aquele belo peixinho saltitante e tomou
todos os cuidados para não machucá-lo. Ao chegar em casa, colocou-o num vidro cheio de água.
Vermelho, assustado, percebeu que havia perdido a liberdade e que, talvez, nunca mais voltasse a nadar nas
profundezas do oceano. Muito triste, o pranto voltou a rolar.

Naquele momento, ao se dar conta da fatalidade que havia se abatido sobre ele, procurou ser forte e manter
a calma, pois de nada adiantaria gritar ou se debater.

Naquele mesmo dia, Vermelho foi transportado com muito cuidado para um outro lugar.
Após rodar bastante, o homem finalmente parou em frente a uma grande loja. Vermelho estava receoso, pois
não sabia o que iriam fazer com ele.

Ao entrar na loja, notou que o lugar era amplo e agradável. Lá estavam algumas criaturas estranhas e
muito barulhentas; umas gorjeavam, outras latiam, algumas miavam, outras comiam cenouras sem parar.
Todas estavam em grandes gaiolas.
O peixinho Vermelho pressentiu que ali seria o seu cativeiro. Tremeu só de pensar.

O comerciante estava sorridente, orgulhoso da sua nova aquisição, então, colocou Vermelho junto com
outros peixinhos. O local, apesar de pequeno, imitava o “habitat” do fundo do mar. Todos o olharam com
curiosidade, mas logo se tornaram amigos.

Vermelho já tinha escutado algumas histórias a respeito dos peixinhos que eram capturados para
servirem de atração para os homens. Porém, jamais imaginou que algum dia estivesse naquela situação.

Apesar de estar sendo bem tratado, suspirava ao lembrar o tempo em que nadava em cardume, com os
amigos, aprontando algumas das suas peraltices em algum lugar no fundo do mar.

Certo dia, entrou na loja um casal com três filhos.
Duda, o mais velho, ficou maravilhado ao observar aquele belo peixinho Vermelho que nadava de um lado para outro
no aquário. Os pais, notando o seu interesse, compraram-no e deram de presente ao filho.

Chegando ao novo lar, Vermelho notou uma criatura com cara de bonzinho, igual ao que tinha lá na loja. De vez
em quando, ele se mexia, abria os olhos, espreguiçava-se e voltava a enrolar-se. Agora, mais despreocupado, o
peixinho continuava nadando de um lado para o outro em seu pequeno cativeiro.

Certo dia, Vermelho escutou seus novos donos chamarem carinhosamente aquela estranha criatura de
meu “Gatinho”. Então, pensou:
– Ah! Então esse é o famoso Sr. Gato… O perigoso devorador de peixes!

O Gato, por sua vez, andava impaciente, não via a hora de ficar a sós com o novo morador da casa. Para não
levantar suspeitas, fingia nem notar a sua presença.
Duda estava muito contente com os seus dois bichos de estimação, uma vez que o gato e o peixinho viviam em
harmonia.

Numa bela manhã de domingo, após tratar o gato e o peixinho, a família saiu para passear. Antes, porém, por
precaução, Duda colocou o aquário bem no alto e, brincando, falou para o Gato cuidar bem do amiguinho.

O Gato balançou o rabo, fez piruetas, enroscou-se na perna do menino, rindo da sua inocência. Depois,
sentou-se e ali ficou.

Vermelho estava apreensivo e nadava nervoso de
um lado para o outro sem parar. Parecia pressentir que
algo iria acontecer.

O Gato, muito malandro, fingia nada ver; no entanto, estava se deliciando com o nervosismo do peixinho. Lá
pelas tantas, o bichano levantou-se, lambeu-se, espreguiçou-se e então resolveu apavorá-lo ainda mais:
– Peixinho! Huu, huu! Agora que estamos a sós, prepara-te que vou te pegar!

O peixinho, apesar de corajoso, estava preocupado, pensando numa maneira de defender-se, caso o temível
inimigo resolvesse atacá-lo.
O peixinho Vermelho estava tenso. As coisas estavam ficando muito difíceis, e ele sabia que logo
ficariam bem piores. O peixinho, de vermelho, estava quase branco de tanto pavor, mas seria bravo, morreria
lutando, pensou.

O peixinho Vermelho estava parado num canto do aquário e lá pelas tantas, disse:
– Por favor, Sr. Gato, comporte-se, não me faça nenhum mal, hein! Pense no que disse o nosso dono. Ele
confia tanto no senhor, até pediu para que cuidasse de mim, lembra?

O Gato levantou-se, arqueou-se, lambeu os beiços de forma assustadora. Em seguida, derrubando alguns
objetos, subiu na estante e, num piscar de olhos, estava em cima da geladeira, ao lado do aquário.

Muito senhor de si, o gato respondeu:
– Escuta aqui, peixinho otário: se eu fosse honesto, não teria a fama que tenho. Além do mais, não adianta
bancar o espertinho, nem tentar me convencer, porque eu vou te pegar, sim! E, quando o meu dono chegar, miarei
suavemente, me enroscarei na sua perna, lançarei um doce olhar, e tudo estará resolvido.

Depois, numa rapidez própria dos felinos, enfiou uma das patas dentro do aquário. Vermelho, ligeiro como uma
flecha, num ato de bravura, deu uma mordida na sua pata, quase tirando-lhe um pedaço. O bichano, assustado,
recuou.

Passado o susto, o Gato voltou a colocar a pata dentro do aquário e, sem querer, plaft! Derrubou o aquário no chão. O bichano quase morreu de susto!

O Gato, surpreso, logo percebeu a agilidade do seu adversário. Por alguns instantes, ficou imóvel, observando o pula-pula do peixinho tentando se salvar.

Em seguida, começou o combate. Vermelho defendia-se dando pulos no ar, parecia um acrobata. O
Gato reconheceu a sua valentia e o admirou por isso. Era um pula pra cá, outro pula pra lá, e o peixinho sempre
conseguia escorregar das garras do seu perseguidor.

Quando o Gato estava quase conseguindo vencer o peixinho, chegaram Duda e a família. Todos levaram o
maior susto ao ver a bagunça. Tinha água e caco de vidro para tudo quanto era lado.

Duda ficou muito desapontado com o comportamento do gato maroto. Pegou-o pelas patas, levando-o
por alguns instantes para fora de casa.

Enquanto isso, o peixinho Vermelho agonizava. Em tempo chegou o socorro e logo foi posto num pequenino aquário.
Duda, chocado com o ocorrido e preocupado com a
segurança do peixinho, pediu para o pai devolvê-lo ao mar.

Vermelho ficou muito emocionado ao avistar o imenso mar azul que o esperava. Ao ser posto dentro
d’água, sem demora desapareceu, indo reencontrar a sua família e todos os seus amigos.

No lugar onde morava, era só alegria. Os peixes deram uma grande festa para comemorar a sua volta.
Vermelho foi recebido como herói. A sua odisseia teve grande repercussão em todo o oceano. Até o rei dos
mares o recebeu em solene audiência.
Em seus poucos momentos de solidão, o peixinho Vermelho relembrava a grande aventura que viveu na
terra no meio daquelas criaturas muito estranhas…